"Até que ponto é libertadora a educação que construímos com as alunas e os alunos na escola? Quantas famílias, docentes, crianças e jovens estão neste momento em ansiedade por se estar a aproximar o início das aulas? Deprimidos, já cansados ou prontas para a “luta”! Não a luta com consciência política, mas aquelas pequenas lutas, que nos põe umas contra as outras, que nos desgastam diariamente, sem almejarem uma verdadeira mudança social.
Docentes a criarem defesas para lidar com as turmas que este ano letivo lhes vão “calhar na rifa”. A prever os problemas disciplinares que vão ter que enfrentar nas salas de aula, a papelada que vão ter que preencher para avaliar as alunas e os alunos. A fechar-se em si, aumentando a falta de colaboração entre colegas.
Pais e mães preparados para se queixarem dos docentes que não tratarem a sua cria como a mais especial, que não derem boas notas, ansiosos com as explicações onde os vão colocar, com os testes, com os trabalhos, …
Miúdas e miúdos preocupados com os colegas, com o facto de poderem não ser aceites nos grupos, com as agressões dos mais velhos, com a falta de empatia de muitas e muitos docentes.
Este cenário pode parecer, e é, uma caricatura. Felizmente algumas de nós não se irão rever nele, mas quem passa horas numa escola, consegue identificar a demasiada frequência destas situações.
Era tão necessária esta libertação de que Paulo Freire fala, nos dias em que vivemos! A utilização de metodologias dinâmicas em contexto educativo é tão mais empoderadora dos nossos jovens! Mas têm sido tão lentas as mudanças…
continuamos a insistir nos mesmos formatos de sala de aula, nas mesmas exposições dos conteúdos, nos mesmos instrumentos de avaliação de há décadas atrás e cujos resultados insuficientes estão mais que estudados.
E curiosamente existe um aparente paradoxo. Ao mesmo tempo que o ensino público insiste nestas metodologias reprodutoras de poder, muitos colégios privados estão a utilizar estratégias que foram criadas para empoderar as classes mais baixas. Caricato, não é? Talvez não! Já pensei bastante sobre isso e cheguei à conclusão de todo o sentido que isto faz – é claro que se ainda empoderarmos mais as filhas e os filhos das elites, as pobres crianças da escola pública, ansiosas com as metodologias antiquadas e com as mãezinhas e os paizinhos e a classe docente preocupada com os testes, nunca chegarão a lado nenhum! Vão indo, vão indo, para dar aquela aparência que até vivemos numa democracia, com igualdade de oportunidades, mas esbarrarão sempre em alguma porta, não por falta de habilitações, mas de competências pessoais e sociais. E lá se mantém do lado dos oprimidos, sonhando em ser opressores!
Enfim! As aulas estão à porta! Vai ser bom rever alunas e alunos, encontrar colegas, fazer projetos em conjunto! Traçar objetivos e estratégias para os alcançar. Ir percebendo as mudanças em todos nós desde setembro até junho.
Ainda há uns dias estávamos de férias e por isso vou utilizar uma metáfora da praia. Por vezes vejo o nosso papel na sala de aula como se estivéssemos com o mar agitado à frente. O mar está assim, revolto. A minha capacidade de mudar o estado do mar é inexistente. Por isso, em vez de construir um muro de areia que será derrubado uma e outra vez pelas ondas, e ainda por cima desgastar-me e praguejar nesse trabalho inútil, porque não pegar numa prancha e conseguir surfar e usufruir com aquilo que o mar nos oferece? Eu gosto de ondas."
© 2024 Rádio Voz da Planície - 104.5FM - Beja | Todos os direitos reservados. | by pauloamc.com