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Cultura

O cante alentejano é património imaterial da humanidade há 7 anos

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O cante alentejano é património imaterial da humanidade há 7 anos


Eram 10.17 horas do dia 27 de novembro de 2014 quando o cante alentejano foi declarado, pela UNESCO, como património cultural imaterial da humanidade. Sete anos passados, a Voz da Planície quis saber como está a sua salvaguarda e como se perspetiva o futuro. Neste contexto ouviu três ensaiadores/cantadores com muito para contar: Paulo Ribeiro, Carlos Paraíba e Jil Galinha, que refletiram sobre estas matérias.

O cante é mantido pelos grupos corais, alguns deles já centenários, e sempre se deu em contextos informais. As letras falam de sentimentos e da vida e a formação dos grupos corais remonta, no distrito de Beja, aos anos 20 do século passado.

“Eu devo meu corpo à terra. A terra me está devendo. A terra paga-me em vida. Eu pago à terra em morrendo”, assim diz a moda, que se ouviu na UNESCO em 2014 e que continua a fazer parte do repertório dos cantadores. E é também o mote para uma reflexão sobre o presente e o futuro desta formar “genuína” de cantar, sete anos depois de se ter tornado património imaterial da humanidade.

Paulo Ribeiro, com um vasto trabalho na área do cante e ensaiador de muitos grupos corais do distrito, reconhece que esta distinção valorizou esta forma de cantar, permitiu um olhar diferente por parte de todos em relação aos grupos corais e reforçou o movimento coral. Sete anos depois, diz Paulo Ribeiro, as coisas esmoreceram um pouco.

Jil Galinha tem 25 anos de idade. Nasceu numa família onde o cante está na “massa do sangue” e por isso afirma que sempre viveu neste meio e que esta forma de cantar foi crescendo dentro de si com o passar do tempo. Há 10 anos que integra “Os Ceifeiros de Cuba” e há cerca de dois que é o ensaiador. Frisou que com a distinção do cante apareceram mais jovens e grupos de jovens a cantar, mas que, como qualquer moda, tudo passa e que neste caso isso também se verificou.

Carlos Paraíba tem 64 anos de idade. Diz que canta desde pequenino, que cresceu no meio do cante, o avô tinha uma taberna junto à casa onde moravam, foi o fundador do Grupo Coral e Etnográfico da Casa do Povo de Serpa e o seu primeiro ensaiador. Carlos Paraíba integrou o Grupo em 1989, está nesta formação há mais de 30 anos e é o ensaiador há 15. Recorda-se bem do que era o cante antes e fala das novidades que foram introduzidas, entretanto, lembrando, contudo, que foi o cante polifónico que foi levado a Paris.

Carlos Paraíba considera que com a elevação do cante houve coisas que se ganharam e outras que se perderam, nomeadamente a ligação às suas raízes. Mas admite que quando o cante se tornou património deixou de ser “foleiro” e que passou a ser visto de forma diferente por todos, jovens e não só e que isso foi bom. Deixou a indicação de que o Grupo de Serpa também participa em experiências, que juntam as modas mais antigas a arranjos modernos, com instrumentos, falando do espetáculo de amanhã à noite, marcado para a cidade branca.

Depois de refletir sobre o passado e o presente do cante, Jil Galinha também pensou sobre o seu futuro e disse não considerar que seja muito risonho, referindo-se aos grupos corais. Este jovem reconhece que os grupos têm muita dificuldade em fazer novos recrutamentos. Revelou que “Os Ceifeiros” têm 4 a 5 jovens, entre os 20 e os 30 anos de idade e um bom futuro pela frente, mas fez questão de afirmar, igualmente, que a introdução do cante nas escolas tem sido positivo, mas que mesmo assim “houve alguma coisa que não funcionou”.

Carlos Paraíba também está preocupado com o futuro do cante. Não escondeu o abalo que a pandemia provocou, porque condicionou os ajuntamentos, mas acha que o futuro do cante está salvaguardado. A sua grande preocupação, e revelou que tem esse trabalho no Grupo de Serpa que ensaia, é manter a forma como se cantava, manter o legado.

Nestes sete anos houve dois, os da pandemia, que fizeram ressentir o movimento coral, mas apareceram novas formações como é o caso do Grupo Coral de Nossa Senhora das Neves, referiu Paulo Ribeiro. E neste contexto, lembrou que todas as tradições têm altos e baixos e que o importante na salvaguarda do cante “é não perder o chão”. Realçando o papel do cante nas escolas, o ensaiador Paulo Ribeiro mostrou-se otimista, reiterando que é preciso conhecer para salvaguardar e dizendo que o cante permanecerá.

Muito se tem feito pelo cante e a MODA – Associação Cante Alentejano é exemplo disso. Nasceu em 2000 e o seu objetivo principal é o de contribuir para  a salvaguarda deste  importante património, através do trabalho direto e em conjunto com os grupos corais, tendo em vista a sua valorização, dignificação,  promoção e divulgação a todos os níveis.

O mesmo tem acontecido com muitos municípios do distrito de Beja que apoiam os seus grupos corais, introduzindo o cante nas escolas e registando em livros e vídeos, o cante. Serpa, Cuba, Vidigueira, Castro Verde e Beja são alguns dos exemplos que podemos referir.

O mesmo se pode dizer dos muitos cantadores, grupos corais, responsáveis pelo cante nas escolas, músicos e outros artistas que se dedicam a estudar, interpretar, promover e divulgar o cante.

E Serpa, que esteve na génese da ideia de candidatar o cante a património, para além da Casa do Cante, inaugurou, no verão deste ano, um Museu dedicado a esta forma de cantar. “Este novo espaço, dedicado exclusivamente ao Cante, nasceu em dois imóveis adquiridos pela autarquia, adjacentes ao edifício já existente. Dotado de um inovador espaço expositivo e interativo, o Centro Interpretativo do Cante, junta-se às valências já existentes, nomeadamente o Centro Documental Manuel Dias Nunes, a galeria de exposições, a loja e o auditório, transformando este equipamento cultural no Museu do Cante”.

A Voz da Planície também vai contribuindo para a preservação do cante. Todas as semanas tem um espaço dedicado ao cante: “Quando o Melro Assobia”, à sexta-feira e ao domingo de manhã o programa “Cante Vivo”.

Fotos: exposições sobre o cante, uma de Serpa e outra de cuba.


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