"Estes resultados têm causas: a primeira é a implosão da maioria absoluta PS, que durou menos de dois anos. Não vou falar dos “casos e casinhos”, mas das opções políticas e orçamentais que levaram à falta de respostas na habitação, na saúde, na educação e à perda de poder de compra dos salários.
Ao mesmo tempo os bancos, as petrolíferas e as grandes superfícies comerciais lucraram como nunca, pois a inflação nunca é neutra: a subida das taxas de juro, imposta pelo BCE, fez disparar os lucros e foi paga com língua de palmo na prestação ou na renda da casa, nos despejos, na conta da água e da luz, na alimentação. Para a grande maioria, sobra cada vez mais mês no final do salário, da pensão ou do subsídio de desemprego…
O imbróglio político atual é também da responsabilidade do Presidente da República, não apenas em 2024, mas desde 2021, quando fez equivaler o chumbo do Orçamento à convocação de eleições antecipadas. Poderia ter exigido a apresentação de novo orçamento, mas fez coro com o governo PS e foi corresponsável pela maioria absoluta. Havia razões fortes para recusar orçamentos que não respondiam, como se provou, aos problemas do país.
Águas passadas não movem moinhos, dirão. O problema é que as águas turvas da inflação, da especulação, da ganância e a crise climática não são águas passadas e irão agravar-se com um governo de direita dependente da sua extrema, o Chega, pelo menos no parlamento.
Aqui chegados, a pergunta impõe-se: porque não capitalizou a esquerda o descontentamento popular com a maioria absoluta PS? E porque cresceu tanto a extrema-direita, saudosista do 24 de Abril, capaz de todas as mentiras e tropelias para semear ódios e captar votos de quem se sente abandonado e excluído, ao fim de décadas de governação neoliberal?
Longe de mim ter todas as respostas. Penso que se exige uma reflexão séria dos partidos que se identificam com os valores de Abril. Não me satisfaz o facto de o BE ter recuperado 882 votos, perdidos em 2022, e de ter subido em percentagem, pouco mais de metade do que teve em 2019. A AD e o Chega elegeram dois dos três deputados pelo círculo de Beja e, pela primeira vez, o PCP deixou de ter representação no parlamento.
Esta reflexão à esquerda não se pode resumir a meras somas aritméticas: sem um programa comum de transformação e alternativa ao atual estado de coisas não é possível mobilizar a esperança das e dos jovens, das e dos mais pobres e oprimidos, das e dos trabalhadores e pensionistas, de quem anseia por um uma vida boa num mundo mais justo e pacífico.
Um programa mínimo comum e mobilizador começa a construir-se desde já, na resistência e na luta sem tréguas contra a direita no governo. Resistência que não pode ficar confinada a este parlamento mais à direita desde o 25 de Abril. Terá de descer às ruas e praças, empresas e escolas deste país.
É o motor da História a funcionar: a velhinha e sempre renovada luta de classes, assumindo novas formas e rasgando horizontes de futuro.
Faltam 38 dias para o cinquentenário do 25 de Abril.
25 de Abril sempre! Fascismo nunca mais!"
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